(foto: Yvette Moura)
... disse que brigaram.
- Disse que rolaram no chão.
- Será?
- Disse que foi...
E assim seguia a conversa desacelerada das irmãs Martins, sempre
a meio tom, num dialeto brejeiro que só os afins conhecem.
Deitadas lado a lado na cama grande, colocavam em dia as
novidades enquanto esperavam chegar o sono da sesta.
O papo começou logo nas
primeiras horas do domingo, e havia apenas mudado de lugar. Primeiro foi na
sala de estar e depois na cozinha; sentadas no sofá, em frente à TV; no banco
do pomar, sob a caramboleira; e agora escorria sem pressa nos aposentos da
anfitriã.
As personagens de suas histórias – acompanhadas aos pedaços
pelas netas, que entravam e saiam do quarto achando a maior graça –, e a
intricada trama que as unia, só elas sabiam e, talvez, só a elas interessasse
também.
Mas dava gosto ver a alegria de estarem mais uma vez em par, Dona Nega
e Dedê.
Vinda do Maranhão, a mais nova enfrentou cerca de trinta
horas de viagem rodoviária para passar uma semana com a primogênita (que é avó
das minhas filhas), em Camaragibe, região metropolitana do Recife.
“Isso é o que ela pensa!”, cochicha pelos cantos, planejando
usar a hierarquia etária para ampliar a estada da irmã em sua casa, e
convencê-la, inclusive, a fazer um “chek up” enquanto estiver por aqui.
Mas uma
harmonia silenciosa rege a relação...
- “Dedê dorme com a mamãe”, determina Simone, tentando
acomodar todo mundo no cômodo mais amplo da casa.
- “Dedê só dorme sozinha”, acode a primeira, que conhece a
irmã muito bem.
- “Eu não sei dormir com ninguém – esclarece a tia, meio sem
graça –, não sei por quê. Sempre fui assim”...
Olhando os “espigões” da Veneza Brasileira, na minha
segunda semana de férias, especialmente os que cercam o apartamento de minha
irmã Lucinha, no Espinheiro, reflito sobre a importância desses afetos que
ultrapassam as armadilhas do tempo quase intactos.
As escolhas que fazemos no período da adolescência –
filosofa meu cunhado Tarcísio, junto às meninas – são determinantes para o rumo que tomará a nossa vida lá na frente.
Mas os verdadeiros afetos, penso, por mais distantes
que possam ficar na linha do tempo, terão sempre a força de ser resgatados,
como se representassem apenas uma vírgula nas nossas existências.
É o que percebo entre Maya, Jade e Luana, por exemplo, que
se encontram poucas vezes no ano, mas logo dão continuidade à belíssima
história de amor que vêm construindo desde pequenininhas.
A chegada de Caio, ao
invés de distanciá-las, uniu-as ainda mais.
E assim também tem sido com as
primas Bia e Júlia, filhas de Lucinha, que encontram apenas nas férias de verão.
Afetos são laços que nos unem e nos identificam, aonde formos,
como membros de uma mesma família.
Embora os encontremos dentro do lar, às
vezes, não é exatamente o sangue que os determina. Mas a aproximação dos
gostos, a semelhança na forma de olhar o mundo, o ideal compartilhado, os
valores cultuados, experiências compartidas...
Uma afinidade construída com pequenas atitudes e singelos,
mas significativos, gestos, ao longo dos tempos, que faz da vida uma preciosa
teia de relações humanas, tecida sob os insuspeitáveis bordados de Deus.
Um comentário:
Ficou lindo, mami! Te amo!!!
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