Olho para trás com carinho e profundo respeito, procurando ver se deixei algum ponto em aberto: um erro que possa ser corrigido; uma palavra mal empregada que suscite mágoa; um sentimento mal resolvido que exija definição; um trabalho que não foi concluído; planos que deixei pela metade...
O que vou encontrando vai sendo olhado de frente, sem medos ou subterfúgios que mascarem a realidade. Vejo se há algo que precisa ser feito, ainda, para que “dê o assunto por encerrado” e procuro concluir tudo que pode ser finalizado antes que o ano acabe.
A minha intenção é não deixar nada pendente para o ano vindouro. Por que eu não gosto de coisas mal resolvidas, nem de expressões “meias”. Numa linguagem metafórica, vou atando os laços desse grande presente que chamamos ‘vida’. E digo ‘presente’ porque sempre estamos ganhando no exercício de existir. Recebemos o melhor que o Universo tem para nos dar e somos constantemente convidados a avançar e evoluir. Essa é uma verdade, mesmo que alguns ainda não consigam enxergar assim!
Parece clichê, ou teoria vã, como diria um amigo meu, mas não é. As perdas sempre trazem ganhos. As dores, aprendizado. As dificuldades promovem união e solidariedade. Há sempre um motivo para sorrir, em meio às lágrimas, e um incentivo novo para seguirmos vivendo, apesar de...
Nesse “balanço”, sempre encontro as coisas boas que me aconteceram e me fizeram feliz também. Encontro a lição de cada momento que passei – com lágrimas nos olhos, muitas vezes – e vejo que, entre perdas e ganhos, o saldo foi positivo. Quando não, procuro tirar proveito do momento simbólico que o calendário oferta e me preparo para construir um “ano novo”, mais feliz do que o que se despede.
O primeiro dia de janeiro, eu gosto de começar agradecendo. Só de saber que é dedicado à Paz Mundial, o meu coração já se abre para o melhor que a vida possa oferecer, já se sente profundamente grato e se prepara para dias melhores. Porque acredito verdadeiramente que a paz do mundo começa dentro de mim.
Lembro, por exemplo, do ano em que “perdi” o meu pai (um ano e meio depois de minha mãe), dez dias antes do Natal. Passei a virada do ano fazendo o registro da queima de fogos na orla. Na manhã do dia primeiro, acordei cedinho e fui caminhar na praia, aproveitando para tomar um delicioso banho de mar.
O céu bem limpo, maré baixa, deitei numa daquelas piscinas que se formam entre os corais da Ponta Verde e, olhando o movimento suave das nuvens, comecei a agradecer a Deus pelo ano que passou e por tudo o que vivi ao longo dele. Agradeci, inclusive, pela partida do meu pai – que se foi em meus braços enquanto cantava para ele, em oração. O homem do mundo se despediu da terra como um verdadeiro cristão...
As lágrimas caíram lentamente pelo meu rosto e um sentimento profundo de paz tomou conta de mim.
Abraçada carinhosamente pelas mornas águas do mar de Alagoas (terra em que aportei por intermédio dele), agradeci pela grandiosidade do momento final com meu genitor, pois, naquele instante ínfimo de nossas existências, o perdão desatou os nós da mágoa, atando-nos para sempre pelos laços do amor.
No balanço que fiz nesses últimos dias, não pude mensurar as perdas que acumulei até aqui, mas a lembrança daquele momento de profunda intimidade entre dois seres, que ainda hoje me emociona, não me deixa dúvida: foi o maior presente que ganhei naquele ano.
@ para o meu pai - pela poesia que havia em seu olhar...
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