terça-feira, 18 de setembro de 2007

Em nome da "solidariedade"

Perguntei a mim mesma se deveria escrever sobre esse assunto ou não. Mas, diante do olhar decepcionado da amiga e das palavras que saíram de sua boca (além da própria frustração que senti ao ver divulgado o resultado da votação que livrou o senador alagoano da cassação do mandato por falta de decoro parlamentar), eu me vi motivada a tecer algumas poucas linhas sobre o que poderíamos chamar de Vergonha Nacional.


Ao tomar conhecimento dos seis votos de abstenção que senadores inescrupulosos tiveram a ousadia de dar em um momento tão significativo para a democracia brasileira como este, Eló me olhou nos olhos e disse: “Você viu isso? Eu nunca senti tanta vergonha de ser brasileira!” Meneei a cabeça, concordando com ela, pois o meu sentimento era o mesmo.


E eu posso dizer, sem medo de errar, que este fato mexeu profundamente com a confiança e a esperança do povo brasileiro. Ficamos todos indignados, enquanto alguns festejavam, lá no Senado, a “bravura e o heroísmo” do arrogante senador. Mas também nos sentimos impotentes e humilhados; mais do que o que já vínhamos nos sentindo com tantos escândalos de corrupção.


Que esperança teremos de que as coisas possam melhorar se os homens que nós escolhemos para nos representar no Congresso Nacional continuam com a velha prática viciada de olhar apenas para o seu umbigo, favorecendo práticas ilícitas pelas vantagens futuras que o posicionamento dúbio de hoje possa lhes proporcionar?


Não questiono a postura dos que se declararam contra desde o início. Esses já mostram por que estão lá. Mas os seis que se valeram do sigilo para não se comprometerem nem com um nem com os outros, como disse o colega Fábio Costa, são os Pilatos às avessas. Ele explica: o procurador romano sabia que Jesus era inocente e lavou as mãos; já esses sabiam que Renan era culpado e lavaram as mãos.


Quando o senador que presidiu a sessão declarou em alto e bom tom “a matéria vai a arquivo!”, eu emudeci. Mas algo dentro de mim gritou indignado e não consegui ri, como fizeram alguns, enquanto demonstravam a sua insatisfação e declaravam que “já sabiam” que seria assim, porque “tudo no Brasil acaba em pizza”.


Eu não consigo achar graça dessa piada, embora entenda que é melhor rir do que ficar maldizendo a sorte do povo brasileiro. Esse sim, bravo e heróico, cujo maior defeito é esquecer rápido demais a traição dos políticos e os escândalos de corrupção em que os seus representantes estão envolvidos.


Surpreendeu-me, por exemplo, a proposta que surgiu na câmara de vereadores para que enviassem uma mensagem de solidariedade ao senador que não lembrou do povo a que pertencia na hora de se beneficiar com seus “negócios” escusos e ilícitos, expondo o seu Estado, mais uma vez, ao achincalhe nacional. Proposta, diga-se de passagem, de um vereador que me parecia sério na luta pelos direitos dos menos favorecidos. Será que me enganei?!


- Solidariedade? Solidariedade a quê?


Em verdade, eu nada tenho contra o presidente do Senado. E nada sei sobre a sua vida pessoal. As poucas vezes em que tive oportunidade de encontrá-lo, e talvez trocar um cumprimento rápido com ele, foi na cobertura de algum evento. Minha indignação é sobre a cara de pau desses políticos que se fazem passar por agentes do povo para se beneficiarem em negociatas sujas e manjadas. Que exemplo estamos dando para as futuras gerações?


Como bem declarou o deputado federal Fernando Gabeira (PV-RJ), independentemente da absolvição haveria uma morte naquele dia. Mas com os votos de abstenção e o resultado daquela votação, o que morreu mesmo, ou pelo menos caiu bem doente, foi a democracia brasileira.

4 comentários:

Marli Santos disse...

A absolvição somente confirmou o que já sabíamos: nossos representantes não são dignos do povo que os elegeu.
Mais que vergonha, sinto impotência diante de tanto descaso para com um povo tão altivo diante das adversidades.

Unknown disse...

Pois é Yvete,o senador primeiro desrespeitou a instituição familiar. Como ele agiria quando soubesse que a esposa o tinha traído com o motorista e ela assumisse o fato? Dizem que aqueles velhinhos lá de cabelos brancos são iguaizinhos aos fariseus que Jesus os chamou de sepulcros caiados. São tão sabidos para algumas coisas e tão ignorantes para outras. Será que eles desconhecem a lei de causa e efeito?

Yvette Maria Moura. disse...

sim, Marli! dá-nos uma estranha sensação de impotência misturada com decepção, indignação...
por isso, senti a necessidade de vestir a camisa do povo brasileiro e dizer o que nós pensamos a respeito de tudo isso.

obrigada pela visita (sempre tão cara)!
bjo.

Yvette Maria Moura. disse...

pois é, amigo.
a ética e a moral passam longe da prática desses nossos representantes que assumem ares tão austeros na aparência, mas conseguem ser tão levianos em suas atitudes.
a lei de causa e efeito é algo que ainda está distante de sua compreensão...
obrigada pela sua visita, Eanes, e pelas palavras tão lúcidas que compartilhou conosco.
um abraço!