quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Breves elucubrações sobre o "Sem Fim"


 
A despeito dos repetidos sopros, a vela flamejante insistia em manter-se acesa...

Os olhos lacrimosos denunciavam, antes de tudo, alegria e gratidão. Em torno de si, parentes, agregados e amigos festejavam a vida cantando e batendo palmas. Ao seu lado, a filha dedicada, as netas e o bisneto posavam para a foto. Mas na torta sobre a mesa, a despeito dos repetidos sopros, a vela flamejante insistia em manter-se acesa...

Que mensagem nos traz este simbólico objeto que parece ter vida própria? Pensei, filosófica, enquanto registrava aquele momento de fugaz felicidade. E desatei ali mesmo o meu rosário de questionamentos sobre o sentido da existência; no exato instante em que comemorávamos os sessenta e nove anos da avó de minhas filhas...

Em que consiste a vida, se chegamos a ela e dela saímos sempre com as mãos vazias? Qual o valor dos dias memoráveis, se nos serão levados tanto quanto os mais difíceis? Que importância tem o aprendizado, se as lições ficarão para trás, assim como os livros estudados, quando nos formos daqui? E por que comemorar a idade nova se a vida na carne é uma irrevogável sentença em contagem regressiva?

Embora não buscasse respostas imediatas, a simples observação daquele instante já me apontava sinais profundos da ação constante de uma consciência extra-física – que a tudo coordena – em nossas vidas, cujos propósitos vão muito além da nossa capacidade de compreensão.

A proximidade dos setenta anos está fazendo de Dona Nega uma criatura mais generosa e afável, e a chegada do bisneto parece lhe ter renovado as esperanças sobre a continuidade da vida – assim como o canto dos pássaros renova aos homens a certeza de um novo dia. 

Pois velhos valores já começam a ser revestidos de uma nova roupagem; mudanças profundas estão sendo instaladas com a apreciação de novos conceitos, e as inevitáveis limitações do “ter” estão, paulatinamente, cedendo lugar às potencialidades do “ser”.

Tenho a certeza de que, como eu (afeita a esta prática desde cedo), também ela já se pega a perscrutar o sentido da vida...

Assim, logo iremos compreender que nós não temos exatamente uma existência curta – como bem declarou Sêneca em seu tratado sobre a brevidade da vida –, “mas desperdiçamos uma grande parte dela”. Pois “a vida, se bem empregada, é suficientemente longa e nos foi dada com muita generosidade para a realização de importantes tarefas”.

Para o filósofo, e ao contrário do que pensam os imediatistas, e aqueles que só enxergam o lado ruim das coisas, nós só sentimos realmente que a vida se esvai quando a desperdiçamos no luxo e na indiferença, sem respeitar nenhum valor ou realizar o que estava planejado para ser feito.

Festejar a existência, portanto, em qualquer época que seja, será sempre oportuno para pontuar a vida e colocar os sentimentos em dia. Afinal “por mais curta que seja, é mais que suficiente, de maneira que, ao chegar o último dia, o homem sábio não hesitará em ir para a morte com tranquilidade”.

Porque terá certamente a consciência de que apenas atravessa a ponte para a Verdadeira Pátria, como bem definiu Cícero (106 a.C a 43 d.C): “deixo a vida não como quem sai de sua casa, mas como quem sai de um albergue onde foi recebido”.

@para Dona Nega, Simon, Luluka, Jade, Maya, Caio e todos que, como nós, costumam celebrar a vida diariamente. 

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