terça-feira, 27 de novembro de 2007

De volta aos passeios pela Via Láctea

É impressionante como um pequeno detalhe tem o poder de mudar a vida de uma pessoa.

Quem tem um pé no sítio como eu, que nasci e passei a minha infância numa pacata cidade do interior pernambucano, cujo nome é uma singela homenagem ao morador mais antigo daquelas terras ribeirinhas, que, por não ser destro nem alto, recebeu o apelido de Canhotinho...

Quem gosta de aproveitar as horas primeiras do dia e costuma, como eu, acordar com os dedos do Sol cutucando a retina e o louvor dos passarinhos à beleza da vida...

Quem ama a noite, como eu, e se deleita com o convecê ancestral de sapos e grilos e tece profundas reflexões na lousa negra da mente, em prolongada vigília...

Quem foi embalado pela irmã mais velha, como eu, que, apesar dos poucos anos que me separam de Ana, fui adotada como “sua menininha” e, no vaivém preguiçoso da cadeira de balanço, infinitas noites, olhamos juntas as estrelas que pendiam do céu como se fossem lâmpadas, realizando incríveis viagens pela Via Láctea...

Quem adora a vida simples, como eu, e acredita que os exageros da sofisticação e o excesso de necessidades criadas pelo homem restringem cada vez mais a sua capacidade de ser feliz e de discernir o falso do real, o útil do supérfluo, o passageiro do infinito...

Quem valoriza as coisas mínimas da vida e, como eu, encontra satisfação em diminutas conquistas e nos pequenos prazeres que nascem das funduras da alma em consonância com a natureza...

Quem se enquadra, enfim, em qualquer dessas situações, há de concordar comigo, com certeza: não há coisa melhor no mundo do que se entregar de corpo e alma ao abraço uterino de uma boa rede.

Que o diga Flávia Batista, que me ligou esta tarde apenas para contar que havia comprado uma rede igual a minha e que estava, naquele exato momento, usufruindo da maravilhosa sensação de aconchego e bem-estar que um simples objeto como este pode proporcionar a quem o possui.

É impressionante como um pequeno detalhe tem o poder de mudar a vida de uma pessoa ou de, pelo menos, contribuir significativamente para a melhoria do seu viver. Costumava lamentar a ausência de uma varanda, onde pudesse pendurar uma rede, cultivar algumas plantas, olhar o céu estrelado, enfim, me aproximar, por pouco que fosse, dos prazeres miúdos que a vida interiorana proporciona.

Morar na cidade tem suas vantagens, é claro, mas nos distancia muito da natureza e contribui bastante para nos manter isolados, cada um em sua gaiola, como se fôssemos pássaros exilados de extensa mata virgem, principalmente numa época em que a segurança pública está cada vez mais precária e a violência urbana, que não existia no Estado de Alagoas, está totalmente fora de controle e tem levado as pessoas a se trancafiarem em casa com medo de assaltos, roubos e seqüestros – acontecimentos cada vez mais freqüentes nesta capital.

Como não sou de desejar o impossível ou de ficar esperando os milagres caírem do céu, venho criando alternativas para viver cada vez melhor. Comecei construindo o meu jardim suspenso (sobre o qual já falei aqui), depois tirei a tela de proteção das janelas (que só me permitiam olhar para fora de forma fracionada, como se o mundo fosse um enorme quebra-cabeça de peças trançadas) e, agora, decidi finalmente armar uma rede na sala.

Minha casa pode não agradar aos mais sofisticados, pode provocar muxoxos entre os mais esnobes decoradores e até distar horrores dos ditames da moda, mas envolve com braços longos e convidativos a quantos lhe adentrem pela porta.

A rede me embala o cansaço e me adula, faz-me companhia nas prazerosas leituras noturnas, aquece a minha alma e me acolhe, igual aos abraços da infância, e ainda me desperta uma alegria sem vírgulas... E apenas porque me traz para bem mais pertinho de mim.

4 comentários:

Anônimo disse...

Sim, é delicioso mesmo! O aconchego da rede, embalando momentos simples e tão cheios de prazer. Mais uma vez estou lisonjeada de ser citada por você. Mas, principalmente, estou grata a vida por nos unir, por me tornar tua amiga e por nos dar a oportunidade de dividir tantas histórias deliciosas.
Beijo gigante!

Yvette Maria Moura. disse...

Namastê!

Anônimo disse...

Amiga Yvette, cá estou como prometido, me deleitando com este teu blog. Concordo com você no que se refere à simplicidade com que devemos viver a vida. Rede e cafuné, quem é que não quer!
Adorei o teu blog. Leve, suave e solto, como você. Deus te faça feliz! xeronocoração. Alonso Filho, o amigo de sempre.

Yvette Maria Moura. disse...

obrigada, querido.
adorei a tua visita;
volta sempre!