quinta-feira, 20 de março de 2008

Correspondências, modernidade e demonstrações de afeto

Pela Internet, fala-se mais por símbolos e códigos do que por palavras.

Às vezes, ao ler grandes cronistas da Literatura Brasileira, como Rubem Braga, Clarice Lispector e Rubem Alves, e vê-los fazer referência a este ou aquele leitor que lhes enviou uma carta, repercutindo alguma crônica lida ou compartilhando com eles passagens de sua vida – o que já se transforma em uma outra crônica –, confesso que sinto uma pontinha de inveja daquele tempo em que se formava um vínculo afetivo entre o escritor e o leitor através das palavras...

O tesouro que constitui uma coletânea de cartas entre amantes da escrita pode ser confirmado nos memoráveis Cartas de amor do profeta, de Kahlil Gibran – que revela toda a beleza do relacionamento platônico vivido pelo poeta asiático e a norte-americana Mary Haskell, alimentado por mais de vinte anos –, e Cartas a um jovem poeta, que reúne a correspondência que se deu entre um estudante da Academia Militar, amante da poesia, Franz Xaver Kappus, e o grande poeta da língua alemã Ranier Maria Rilke no período de 1902 a 1908.

Nos dias atuais, em que o correio eletrônico substitui quase que por completo a troca de missivas, a poesia das correspondências foi atropelada pelo avanço fantástico da tecnologia, que encurtou as distâncias – permitindo uma comunicação em tempo real – e diminuiu consideravelmente o uso das palavras.

Pela Internet, fala-se mais por símbolos e códigos – como abreviaturas e as famosas “carinhas”, que traduzem o estado de humor do interlocutor – do que por palavras.

Nada contra o avanço tecnológico nem as facilidades que ele nos traz (o que seria da nossa vida, hoje, sem o computador?), mas não posso deixar de dizer que sinto saudade daquela antiga forma de comunicação. Principalmente nessa troca de confiança e respeito que se cria entre aquele que expõe o seu pensamento e o que, na intimidade do seu lar ou no ambiente de trabalho, o absorve.

Várias vezes, o leitor – que se tornou amigo – Bernardino Nogueira questionou a esta cronista se as pessoas não lhe telefonavam para comentar sobre os textos publicados toda terça-feira em O Jornal, pois alguns lhe tocavam de tal maneira que ele não conseguia conter o impulso de me telefonar para tecer algum comentário, ainda que breve, pelos “fios da tecnologia”.

Sempre reservada, apesar de compartilhar com o leitor algumas passagens de minha vida, nunca comentei aqui sobre as várias expressões de carinho que me chegam em resposta às crônicas publicadas, como o rapaz que me surpreendeu, certa feita, quando eu o abordei numa tarde/noite de domingo, na orla da Ponta Verde, para saber as horas. “Gosto muito das suas crônicas” – disse-me ele antes de responder. “Elas fazem muito bem à alma!”

Ainda desacostumada com comentários assim, feitos à queima roupa, fiquei sem saber o que dizer: apenas curvei a fronte e lhe agradeci repetidas vezes pela gentileza de suas palavras. E ele nem desconfia que, com aquele gesto, dissipou de uma vez a pontinha de tristeza que eu carregava comigo naquele dia...

Há duas semanas, outra manifestação de afeto me deixou emocionada. Ao abrir o meu e-mail, deparei-me com um singelo recadinho de uma pessoa que se identificou como Jacqueline. Ela dizia ser leitora assídua do Palavra de Maria (meu livro eletrônico) e agradecia por tudo o que havia recebido de mim através dos escritos e das palestras, proferidas em alguma Casa Espírita, que havia assistido.

Em troca me presenteava com a reprodução de uma canção gravada por Tavito. Aproveito a oportunidade, antes que me faltem as palavras, para lhe agradecer pelo carinhoso gesto, Jacqueline. Principalmente porque, como na música (que também gosto muito), de vez em quando sou tomada por uma certa nostalgia de épocas e hábitos que exalavam profunda poesia:
“Sem querer fui me lembrar de uma rua e seus ramalhetes; o amor anotado em bilhetes; daquelas tardes...”.

@para Jacqueline, por me oportunizar este breve escrito.

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