segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

A janela, o caju e o passeio das nuvens

“As nossas atitudes é que vão imprimir, nesse chão, a marca diferenciada da nossa passagem, pois a vida reclama operosidade e ação sempre”

Preparado o ambiente, sentada à janela do quarto de Aninha, inicio a primeira crônica do ano saudando a natureza com olhos atentos e contemplativos. Como se emoldurasse uma tela singular, pintada pelas mãos de primoroso artista, a janela descortina uma obra prima, cuja beleza e expressividade declaram todo o potencial Divino.

São árvores frondosas que balançam ao correr da brisa, pássaros diversos em seu gorjeio matinal, galinhas rodeadas de imensa prole ciscando pelo terreiro de chão batido, cajueiros floridos com frutos suculentos pendendo na extremidade dos galhos e uma grande variedade de seres que têm forma, som, cor e cheiro próprios, e seguem a sua programação diária alheios à minha presença.

De férias, na casa de minha irmã Ana, no agreste pernambucano, me esforço por vos descrever o belíssimo cenário que me rodeia. Aqui me encontro para “recarregar as baterias” e nutrir a alma, ao mesmo tempo em que acompanho as meninas em suas férias de verão e aproveito para rever a família.

Sou a caçula de seis irmãos e a única que atravessou as fronteiras de Pernambuco para erguer além de seus muros o seu projeto de vida. Voltar aqui, é como retornar ao útero materno e me encontrar comigo mesma. A simbologia da janela me permite rever momentos do passado e estabelecer novas metas para o ano que se inicia, mas “a luta” só começa mesmo quando calço as botas da coragem e retomo a batalha do dia-a-dia.

Viver, amigos, não é tarefa fácil para ninguém, mas quando nos permitimos à oportunidade de um breve distanciamento do cotidiano para lançar um olhar mais crítico sobre a dinâmica que estamos adotando na condução da existência, é possível avaliar se estamos seguindo na direção certa ou se pegamos um atalho em algum ponto do caminho. Em todo caso, há sempre algo que precisa ser mudado para que tudo funcione melhor.

Lá fora, um passarinho me chama a atenção, insistentemente, sem que eu consiga enxergá-lo, camuflado entre a folhagem. O insigne gesto, no entanto, me convida a perscrutar ainda mais a paisagem emoldurada e me fazer receptiva aos seus sinais subliminares. A que me convida a Natureza, através do pequeno mensageiro? Aguço os sentidos e aguardo o entendimento...

O vento farfalha as palhas dos coqueiros e deixa eriçada a copa da pitombeira. Tudo me convida a olhar para o mais alto até que, intuitivamente, meus olhos ultrapassam os limites da folhagem e fitam o céu azul-bebê – animado pelo caminhar sereno de extenso floco de brancas nuvens. A mensagem me parece clara, como se uma voz me dissesse, no íntimo, que está tudo sob controle: Deus está no comando! Enquanto isso, um caju amarelo se desprende do talo e salta para as possibilidades do seu breve futuro...

Assim é a vida! Penso. Cada instante vivido revela o que está reservado ao momento seguinte, nesse eterno presente em que tudo está subordinado a uma ordem comum. As nossas atitudes é que vão imprimir, nesse chão, a marca diferenciada da nossa passagem, pois a vida reclama operosidade e ação sempre (para o nosso próprio bem!).

Cabe utilizarmos a figura da janela a fim de permitir que a presença divina nos anime o mundo íntimo, solvendo a tristeza com a força da alegria, vencendo o desânimo com a alavanca da fé e aplicando o amor na solução dos problemas que forem surgindo.

Até que o nosso coração cultive o hábito de se erguer sempre para o mais alto, vencendo os limites da paisagem moral em que nos encontramos, e viver se torne uma prática serena como o passeio das nuvens – que não borram o azul-bebê do céu que percorrem, nem apagam a luz do astro rei que lhes permite a passagem.

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