quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Tempo de contrastes

(foto: Yvette Moura)

Conversava alegremente com uma amiga quando foi atingida por um raio e morreu carbonizada, ainda com o telefone entre os dedos; abria a janela da casa, para saber a origem do estrondo que o acordara, quando foi empurrado, morro abaixo, por toneladas de barro e pedaços da casa da vizinha do alto, ouvindo ecoar no vazio, pela última vez, a doce voz da pessoa amada; preparavam-se para fugir, levando alguns poucos pertences que pareciam importantes, quando a água irrompeu pela porta dos fundos e, rapidamente, varreu toda casa, arrastando a família inteira com uma força maior do que a de cem homens marombados; tentava salvar o animal quando o rio o engoliu por inteiro e arrotou furiosamente a sua alma, metros adiante, como se fosse o resto de nada...

Depois de tantos desastres – em que a resistência dos homens foi testada à exaustão pela Natureza –, janeiro se despede deixando um rastro de dor, morte e destruição.

Pródigo em contrastes, o mês que me renova a idade (16) tem se caracterizado, cada vez mais, por dias abafados e chuvas torrenciais. Intenso, cumpre a difícil tarefa de remover a terra da acomodação humana, convidando as criaturas a saírem da zona de conforto que criaram para si mesmas, a fim de avançar na escala evolutiva do planeta.

Não demora muito e a ajuda começa a chegar, indistintamente, como se fora uma necessidade preexistente, para quem dá quanto para o que recebe. Aqui, é o vizinho que consola os que perdem os parentes, cava a terra em busca de sobreviventes ou oferece o calor de um ombro amigo. O aconchego de um lar; o balsamo de um abraço e o reconforto de um café bem quentinho também não tardam...

Acolá, outros se dão as mãos, somam esforços e agregam forças numa corrente invisível de solidariedade. Em toda parte, a palavra de ordem é ajudar, e cada um dá um quinhão do que lhe sobra, contribuindo para o movimento crescente que salva vidas.

Instigado pela dor, aos poucos o Homem vai tapando os buracos da própria precariedade e arrastando as correntes da prisão/escola em que está inscrito para o aprimoramento da alma, enquanto aprende a rezar a oração de cada dia, imolando as contas do rosário de sua vida, repetindo as lições, muitas vezes, até ser liberado pelo tribunal da própria consciência.

O primeiro mês do calendário não tem qualquer responsabilidade com as cobranças que endereça ano a ano, assim como um mensageiro não pode ser responsabilizado pelo conteúdo da carta que entrega ao destinatário. Ademais, o tempo é contínuo mesmo e o mês de janeiro nada mais é do que um pequeno traço marcado na roda-viva da Eternidade.

Uma homenagem a Jano – deus do começo na mitologia romana –, também tem duas faces simbólicas: uma olhando para trás (passado) e outra, para frente (futuro), como a lembrar que a dor, a morte e a perda são etapas temporárias do crescimento espiritual: portais que conduzem à alegria, à vida e ao amanhã ditoso do espírito imortal.

Pois janeiro também é o mês das praias cheias, do bronzeamento natural da pele, da irreverência e da extravagância juvenis, das horas frouxas das férias e das tardes mornas vencidas nos parques, entre crianças e animais de estimação, leituras e brincadeiras várias; tempo do verdor das amizades; época dos namoros e das descobertas do amor...

Mês do Dia Internacional da Paz, Dia Nacional da Gratidão, Dia Nacional do Mensageiro; também o do seu dia, leitor, assim como o do dia do fotógrafo e da fotografia; do dia do aposentado, do jornalista, da cidade de São Paulo... E do Dia da Saudade – sentimento nominado apenas pelo português.

Janeiro de Grandes Espetáculos - pernambucaníssimos e iberoamericanos –, dos festivais de verão e de outras tantas atividades culturais: trinta e um dias de intenso movimento, convidando à vida e à renovação.

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