sábado, 18 de novembro de 2006

O carteiro dos céus

Diz o ditado que “Deus escreve certo por linhas tortas”. Eu prefiro acreditar que Ele escreve certo. E ponto. As linhas tortas somos nós que criamos. Pela necessidade própria que o homem tem de errar, talvez. Para depois ter a necessidade de dar voltas e voltas, tentando contornar o malfeito. O engodo. O equivoco que cometeu.

Aliás, eu diria que os seres humanos são as tentativas de acerto de Deus. Não que Ele os tenha criado imperfeitos, mas é que com o livre arbítrio que lhes concedeu, deixou em suas mãos a opção do acerto. A possibilidade de vitória sobre si mesmos, antes que sobre os demais.

Mas há os que erram por opção. Por pura provocação. Ou invocação até. Resolvem descontar no mundo a raiva e o rancor que guardam de si mesmos. E assim, vão levando a vida como se dessem “murro em ponta de faca”, para não fugir ao contexto.

Outros há que seguem à toa na vida, como diz a canção. E vão ficando à margem, vendo a banda passar. Não estão nem aí para nada. Não querem saber de compromisso com ninguém. Muito menos com essa história de ser filho de Deus. “Eu sou um a-n-a-r-q-u-i-s-t-a”, disse um amigo quando foi questionado sobre o que estava fazendo para demonstrar seu amor e a gratidão ao Pai.

Pois é. Os anarquistas de plantão são essas pessoas que fogem do comprometimento. Dão duro por uma causa rentável ou que lhes gere prestígio, mas são incapazes de fazer algo por alguém que nada possa lhes dar em troca.

Há também a malta dos indiferentes. Que vivem no mundo como se nada lhes dissesse respeito. A não ser os cuidados consigo mesmo. E olha que esses se cuidam muito bem! Agem como os “filhinhos de papai”: o mundo a seus pés e todos à sua volta. São os egoístas. Para quem nada mais tem importância que não eles mesmos e tudo o que está relacionado a si: seu trabalho, sua família, sua felicidade, sua dor, seu problema, sua mágoa, e etc, etc, etc.

Mas há os que se ocupam do Bem Comum. Como a terra fértil descrita por Jesus na parábola do Semeador, eles se dividem em três grupos: os que pensam no Bem, os que trabalham para que o Bem aconteça e os que vivem exclusivamente para servir ao próximo. Para esses, a alegria de viver está na prática de fazer o bem sem olhar a quem. São pessoas que espalham sorrisos e doam de si aquilo que lhes sobra no coração.

Ano passado, Maceió ficou órfã de um desses poucos filhos de Deus. Francisco de Moraes Sarmento, 86, ou simplesmente Irmão Sarmento, como era carinhosamente chamado no meio Espírita, despediu-se da terra, voltando à casa do Pai.

Quando jovem, esse irmão criou os filhos com a profissão de carteiro. De sol a sol, percorreu incansável, infinitas vezes, as ruas dessa capital, levando missivas, aproximando as pessoas e aliviando a saudade das criaturas que estavam distantes...

Quando conheceu a Doutrina Espírita, o carteiro foi convidado a auxiliar mais ainda na Sementeira do Bem. De imediato aceitou o emprego. E desta feita, foi promovido a porta-voz das dores alheias. Pelo fenômeno da Psicofonia e no 'Atendimento Fraterno' da Casa Espírita, Irmão Sarmento aliviava corações, enxugava lágrimas, apontava caminhos, e era sempre a palavra doce e amiga para quantos o procurassem.

No mês em que se comemora a morte física de Chico Xavier, esse outro Francisco foi chamado de volta à Pátria Espiritual. E eu desconfio que foi o próprio Deus, escrevendo pelas ditas linhas tortas, que chamou Seu Sarmento para uma outra missão: ele será o novo carteiro dos céus, que trará do Alto as missivas de Deus - para encurtar as distâncias que ainda há entre o Pai Maior e os filhos da terra.

Nenhum comentário: