quinta-feira, 15 de julho de 2010

Pobre menino rico

Menino pobre, abandonado pelos pais desde os primeiros dias de vida – tendo sido criado pela avó em uma das favelas mais perigosas da capital mineira e, muitas vezes, experimentado carências múltiplas e privações materiais –, ele tinha tudo para ingressar na marginalidade.

O mundo do crime e das drogas - em contraposição à miséria, que se lhe impregna como uma doença - é a sina que o meio hostil reserva à maioria dos pivetes da periferia. Pelos dados do Ministério da Justiça, em pesquisas recentes, o Brasil vai perder 33 mil jovens por conta do tráfico de drogas nos próximos dez anos. Só em Maceió, serão 7 mil envolvidos nessa onda de violência.

Fugindo aos prognósticos da sua condição social, no entanto, Bruno começou a carreira aos 12 anos de idade, em um time de futebol da periferia de Belo Horizonte. O garoto enjeitado tinha talento. Dedicado e de bom comportamento dentro do campo, seis anos depois ele já estava defendendo o maior time do seu Estado, e a fama e o dinheiro começaram a chegar aos borbotões.

Da infância carente ao status de goleiro titular do time brasileiro de torcida mais numerosa, o Flamengo, a vida de Bruno parece ter dado uma guinada de 360º num tempo curto demais. O mundo futebolístico abriu as portas para uma série de desregramentos que parecem andar atrelados à prática dessa modalidade esportiva. Noitadas sem limites, regadas a muita bebida, drogas dos mais variados formatos e efeitos, além de sexo livre com garotas de programas e candidatas à ascensão social, passaram a fazer parte da vida desse jovem sem que ele pudesse fazer qualquer julgamento mais profundo sobre o próprio comportamento.

Os conselhos da avó/mãe enfrentavam uma concorrência desleal na vida do goleiro e, para ele, assim como para tantos outros que trilharam caminhos semelhantes, tudo era permitido e todo pecado, perdoável.

Mas como se fora uma ousadia grande demais deixar a favela para se tornar um astro da bola, foi numa dessas farras que o jogador encontrou a pessoa que iria devolvê-lo ao seu ponto de partida. Sonhando com a riqueza fácil e a ascensão social sem muito esforço, físico ou mental, a jovem modelo viu naquele ídolo da bola o seu bilhete de loteria sorteado, e investiu todas as fichas no grande prêmio. Mas foi a imaturidade de ambos, e a autoconfiança excessiva nas armas que julgavam infalíveis, que lhes traíram de forma letal...

A moça se gabava dizendo que ele estava “cutucando a onça com vara curta”, e apostava no escândalo e na imprensa sensacionalista para intimidá-lo; o astro sonhava com a Copa de 2014 e apostava na impunidade. Um encontro que teve a força de uma bomba atômica para ambos: ela pagou a ambição desmedida com a própria vida (morta com requintes de crueldade), e ele teve as medalhas trocadas por algemas, além de ver escorrer por entre os seus dedos, da noite para o dia, a promessa da Copa, o contrato milionário com o Flamengo e a liberdade.

Pobre Elisa Samudio, que trocou a experiência rica da maternidade pela ilusão vazia da "vida fácil". Pobre goleiro Bruno, que saiu da favela, mas não conseguiu fugir à sina da marginalidade. Um crime não invalida o outro, é verdade; mas não há nada que justifique a morte...

Fica a história do atleta para ser estudada pelos especialistas, e o exemplo da modelo para não ser copiado pelas suas amigas. É preciso mudar o paradigma da impunidade, e varrer da Terra, de uma vez por todas, essa violência contra a mulher –com agressões gratuitas, ameaças de morte e assassinato.

Chega de homens que amordaçam e matam em nome do amor. Chega de celebridades sem dotes reais, e de astros e estrelas com luminosidade parca e duvidosa. Sinto saudades de um tempo em que o homem valha pelo que ele é, seja reconhecido pelo amor que externe e amado pelo bem que espalhe.

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