quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Sob o espírito das flores

A expectativa sempre é grande. Principalmente entre os mais novos, que só a conhecem pelas longas e floreadas histórias dos mais antigos. Estes, que já tiveram o enorme prazer de recebê-la incontáveis vezes na casa da vida, agora esperam novidades, que serão compartilhadas mais na frente com os que virão à retaguarda.

A sua chegada é sempre envolta em clima de ansiedade e extensos preparativos entre os homens. Não que se deteste aquela que lhe antecede a estada, mais reservada e um tanto chorosa, mas porque esta é sempre mais risonha e calorosa do que a que ora se despede. A sua alegria é ingênua e pura, como a de uma criança, pois, apesar de crescida, ela nunca deixou se perderem os traços da meninice.

Ao contrário da outra, sempre tão saudosa e recolhida nas lembranças de um passado longínquo, essa costuma chorar de alegria e de tanto achar graça na vida, rodeada pelas crianças – que brincam e cantam de mãos dadas à sua volta – e abraçada pelos mais idosos em longos passeios matinais, quando falam de esperança e dias mais felizes.

- Ela está chegando! Ela está chegando! A nossa prima está chegando! – gritam os pequenos, animados, correndo de um lado para o outro, ansiosos por poder aproveitar essa temporada na companhia da nova amiga.

Os mais velhos sorriem satisfeitos com tamanha euforia. Afinal, também já viveram essa época e sabem que ela é mesmo assim, cheia de expectativas. Os seus corações, já um pouco mais cansados, parecem florescer de novo, nesse tempo, como um extenso campo ao sol.

Uma a uma, vão se abrindo as flores – margaridas, pingos de leite, rosas, girassóis – sobre o verde monocromático que antes havia. Tudo parece renovar-se aos poucos; ganhando novos ares, ficando mais bonito e feliz. O dia vai se igualando à noite em sua duração até vencer essa lúdica queda-de-braço, que permite ao sol estender-se por mais tempo sobre a Terra, aquecendo assim a temperatura enregelada dos corações humanos...

De fato, todos são contagiados pela doce expectativa da chegada da prima. Os céus oscilam entre a lágrima e o sorriso, a chuva e o sol; os mares trocam suas águas frias por outras “más calientes”; e os ventos vão e voltam, indecisos, como se, ao mesmo tempo em que intentam cumprir o dever de assoprar por outros campos, guardassem o desejo secreto de bafejar por aqui ainda mais um pouco, na ânsia de ganharem, quem sabe, um beijo molhado da prima querida...

Raios, ventos fortes, quedas de granizo, toda a natureza se altera, alternando massas de ar quente e frio por todo o corpo geográfico desse país, como se sofresse coletivamente de uma espécie de tensão prévia; um desejo tolo de apressar o tempo ou, quem dera, esticá-lo um pouco mais durante a estada da prima Vera.

Ana, Cláudia, Júlia, Morgana, Lucinha, Tereza, Clara, Simon – sem lhes diminuir a importância –, nenhuma de vocês se compara à esperada prima, que aportará entre nós, nesta quinta-feira, para passar uma deliciosa temporada de quase três meses. Em sua companhia, as nossas tardes serão mais quentes, embora nos banhe, às vezes, uma chuvinha fina, à tardinha, refrescando a noite e nos proporcionando um agradável repouso sob o sopro frio do acalanto noturno.

Feliz daqueles que, a exemplo de Guiomar e Elis (que abrem a temporada), Rodrigo (o menino-presente), Bia (a pernambucaninha), minha menina Maya (despertando para o mundo dos adultos), Alberto (que afina a alma com mantras indianos), João (o inspirador das palavras de Maria) e Lua (vivendo nova fase) têm o privilégio de gritar aos quatro ventos que vieram ao mundo, como diz Cecília, “sob os finos clarins que não ouvimos soar por dentro da terra, nesse mundo confidencial das raízes, onde arautos sutis devem acordar as cores e os perfumes e a alegria de nascer no espírito das flores para o doce reinado da primavera”.

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