quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Intercâmbio

(foto: Yvette Moura)


Quando a vi caminhando em nossa direção, vestindo um casaco verde sobre o jeans desbotado e expressando timidez e cansaço por trás do rosto sorridente, percebi, de imediato, que havia feito a escolha certa. Afinal, é preciso mais que ousadia e coragem para ir à busca de um sonho. Um pouco de ingenuidade também é fundamental...

Se for responsável demais, a criatura não arreda o pé do seu canto, apegada aos deveres e às preocupações imediatas. Despojada de certas convenções sociais, é possível deixar para depois o que parece ser inadiável.

- Eu pedi demissão do trabalho para vir conhecer o Brasil! Disse-nos entre sorrisos, tentando explicar o motivo da sua longa viagem. Duas semanas de aulas de português, e voou para a América do sul, aportando em São Paulo. Mais duas semanas aprendendo o nosso idioma, e Paola chegou a Maceió.

A ansiedade era grande. Queríamos conhecer a amiga mexicana de Jade, que por três anos só existiu no campo virtual. Abraçamo-la e ela se tornou real.

Demos uma volta pelo centro e seguimos pela praia até chegar à casa. O Palácio do Governador, a Praia da Avenida, a Pajuçara, a Ponta da Ponta Verde – tudo estava ainda adormecido, na madrugada de ontem, quando retornávamos do aeroporto.

Quando fechei os olhos para algumas poucas horas de descanso em minha cama, antes de levantar mais uma vez para pegar no batente, fiquei ouvindo Jade papear com a amiga, escutando os seus sorrisos descontraídos, até que se despediram combinando caminhar na orla dali a algumas horas. Só então senti o corpo relaxar e a mente se deixou abandonar n’algum lugar distante e seguro, no universo de si mesma.

Ao ouvir o despertador, já parecia refeita, embora soubesse que as horas roubadas do sono certamente voltariam para reclamar. Mas a alegria de ter Paola conosco me ajudou a seguir em frente. Saber que minha filha estava feliz recompensava todo cansaço...

Estudante de inglês durante toda a adolescência, sempre gostei de conhecer pessoas de culturas diferentes, e não perdia a oportunidade de conversar com “um gringo” que encontrasse pelas ruas do Recife. Assim foi com o alemão Christian e com o israelita Kobi, que, em épocas diferentes, passaram um carnaval em nossa casa.

Este último, recem “liberto” das obrigações com as forças armadas do seu país, resolveu dar a volta ao mundo antes de entrar na vida de adulto. Chegou ao Brasil nas vésperas do período momesco. Dizia ter deixado o coração nos Estados Unidos, para onde pretendia voltar depois que conhecesse toda a América Latina.

Naquele carnaval, eu fui o elo entre ele e o resto da turma, que não falava inglês. Certo dia, fiz greve de tradução para castigá-lo por ter dito que não precisava de mim para se comunicar com os outros. Acabou me pedindo arrego... Apesar do pouco tempo, construímos uma amizade muito gostosa, baseada na alegria, na cooperação e no respeito mútuo.

Não sei se voltou aos Estados Unidos e se casou por lá, como planejava; ou se voltou para o exército do seu país,eternamente em conflito com os palestinos, e foi abatido em algum bombardeio. Perdemos contato... Dele só guardo boas lembranças, as fotos dos nossos passeios e um exemplar d’O Diário de Anne Frank – com que me presenteou para que eu conhecesse um pouco mais sobre a história do seu povo.


@para Paola e todos os seus.

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