terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Tempo de florir

Seus olhos brilhavam como dois diamantes e as faces queimavam como fogo quando foi anunciar que avistara no céu a inconfundível estrela aos sábios do seu reino. Chamou-os um a um, com seus pergaminhos embaixo do braço, mas nenhum aceitou empreender a longa viagem pelo deserto em busca do menino-deus, que acabara de nascer no Oriente.

Não era um evento comum, sabiam, mas o convite era ousado demais para criaturas tão ocupadas e com interesses tão variados quanto eles. Para muitos, ele não passava de um lunático, que virou lenda em seu país...

Acompanhado apenas de um jovem escravo de seu pai, Artaban vende tudo que tem e segue viagem para se juntar aos outros três monarcas que irão levar presentes ao rei dos reis. Pendurada no pescoço, leva consigo toda riqueza que possuía: três gemas preciosas para reverenciar o enviado de Deus.

Ao longo do caminho, encontra um velho moribundo precisando dos seus préstimos de médico e, apesar dos apelos de Orantes (que desejava empreender a viagem o quanto antes para mais rapidamente poder voltar à Pérsia), o jovem rei não hesitou em ficar alguns dias para cuidar do pobre homem. Fez o que exigia a própria consciência...

Por conta do atraso, perdera-se dos outros reis e daquele que era o real motivo da sua viajem. Mas ao invés de desistir, resolveu seguir adiante, e durante trinta e três anos empreendeu uma busca incansável para encontrar o mestre dos mestres.

Em vão. A desdita e a dor alheia sempre se impuseram em seu caminho, desviando a marcha. Cuidando de doentes, em socorro dos oprimidos e ensinando párias a cultivar a terra ao invés de pedir esmolas ou roubar, no vale dos leprosos, o rei gastou os seus melhores anos e as gemas preciosas que trazia junto aos degredados da sociedade.

Passados os anos, agora velho e à beira da morte, Artaban finalmente encontra o Mestre, e só então descobre que já O havia presenteado há muito tempo...

Refletindo sobre a saga do rei mago que não entrou para a história, mas se tornou o maior entre esses sábios pela intensidade da sua trajetória – no filme “O Quarto Sábio”, baseado no clássico do diplomata, pastor e escritor norteamericano Henry Van Dyke (1852 – 1933) –, observei que todos nós elegemos os nossos mestres e empreendemos as nossas buscas, independentemente de nos apercebermos disso ou não.

Muitos, alheios ao verdadeiro sentido da vida, elegem os bens materiais e as convenções sociais da Terra como seus deuses, e empregam todos os seus esforços e os seus anos mais saudáveis para possuir e prolongar o que incontestavelmente é passageiro; outros, descompromissados com o que quer que seja, preferem viver anarquicamente, indiferentes aos convites do mundo – que desenvolvem a inteligência e exercitam a moral – e os apelos da alma – que anseia por vôos cada vez mais altos, espiritualmente falando.

Entre um e outro extremo, estão aqueles que já reconhecem a sua real dimensão: diminutas criaturas em processo de evolução – intelecto, moral e espiritual –nessa imensidão de moradas chamada Universo.
Esses, cientes de que precisarão do outro para chegar ao ponto almejado, elegem o Mestre dos mestres como guia e modelo, sem jamais esquecerem de também fazer-se ponte para aqueles que vêm à retaguarda. A exemplo de Artaban, compreendem que mais rápido chega ao fim aquele que se entrega à caminhada.

Neste Natal, estimado leitor, dois mil e dez anos após o maior evento já ocorrido na face do planeta, é oportuno que tenhamos a coragem de olhar para dentro de nós mesmos em caráter de reconhecimento. Ou simplesmente nos lancemos para frente nessa busca inusitada.

Afinal, que importância tem os espinhos para quem aspira a essência das rosas? Cultivemos “a terra”, pois, enquanto estamos a caminho.

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